domingo, 8 de agosto de 2010

Dia dos Pais




Taí, eu costumo falar pouco de meu pai.
 
Sempre vi meu pai como um irmão mais novo (mais novo que meu irmão caçula) porém, com mais idade que eu, e "coincidentemente, me gerou. Ele é uma pessoa bacana e do bem. Existem muitas coisas no meu pai que me faz admirá-lo bastante_outras, nem tanto.


Contraditório, apesar de dizer que a solução de sua vida seria ficar rico, é desapegado ao dinheiro. Se um dos seus filhos diz que precisa de dinheiro para algo, não pensa duas vezes em ajudar, mesmo que com isso, se aperte em dívidas e deixe de cumprir com compromissos importantes.


É um sujeito boa praça e faz amizades por onde passa. Se vai ao supermercado, por exemplo, conversa com metade dos funcionários e clientes, sendo eles conhecidos ou não (às vezes, acaba conversando com quem está junto a ele na fila da carne, por exemplo), faz piada de alguma situação e acaba amigo de um monte de gente. Mesmo sem possuir muitos recursos, já gerou muita inveja (eu realmente quero dizer MUITA inveja mesmo) em seus companheiros de trabalho ao ponto de acabar passando por momentos de necessidades extremas. Parte disso se deve ao fato de mau pai não ter muito planejamento para nada.


Displicente, já nos fez perder bastante coisa dentro de casa, como aparelhos eletrodomésticos e eletrônicos que colocava no conserto e nunca buscava. Minha mãe sempre ficou fula com isso. Se minha mãe me espancava por qualquer razão, meu pai raramente levantava a mão para mim (mas quando resolvia fazê-lo, fodeu. Eu apanhava pra cacete).


Meu pai parece ter um conhecimento datado a respeito das pessoas. No meu caso, ele parece se lembrar de mim como uma criança de cinco anos que foi com ele ao mercado e disse gostar muito do biscoito "drink". Ele, que antes de ouvir isso comprava periodicamente caixas de biscoitos diversos da piraquê, muitos pacotes sortidos de salgadinhos da elma chips, passou a só me trazer o biscoito drink, por muitos anos seguidos, mesmo quando eu já não queria mais vê-lo na minha frente. Até hoje ele me pergunta se ainda gosto desse biscoito. Coisas mais atuais, por exemplo, ele parece nunca se lembrar, perguntando-me ano após ano a mesma coisa, como se fosse uma "novidade-novíssima". E eu, impaciente às vezes nem respondo, ou respondo de maneira malcriada. Admito que muito da configuração de quem sou tem influência de meu pai também.


Meu pai é um artista auto ditata. Apesar de não saber ler uma partitura, toca bateria sem dever nada a nenhum profissional famoso. Já trabalhou por anos em sapatarias e já foi motorista de taxi também. Com essa última profissão ele tinha mais problemas que qualquer outra coisa. Já foi sequestrado, praticamente pagava pra trabalhar e não tinha uma hora para descansar. Sempre manifesto meu orgulho por ele ter largado esse rabo de foguete.


Musicalmente falando, dou graças a Deus por herdar de meu pai o meu gosto musical. Apesar de ter odiado os Beatles _e de bateria_ por muitos anos a fio (quando eu era criança, meu pai saía pra tocar em um conjunto e geralmente era Beatles. Eu julgava que era por causa deles que minha mãe ficava solitária em casa e acabei fazendo uma associação errônea) eu sempre AMEI Lisa Stansfield, que meu pai também adora.


Algo que me faz rir de quado em quando é o vício dele por pó. Calma, estou falando de SUCOS em pó. Ele não vive sem. E me apresenta sempre orgulhoso a novos sabores do que chamo de "tintura pro estômago". Rio de também, quando não me aborreço, de quando ele liga a tevê ou o rádio e começa a criticar tudo o que vê. Ninguém nunca é bom o suficiente em nada. E se ele escuta alguma versão de uma música que gosta, ah, vai cuspir carrapichos o dia inteiro.


Apesar de ele vir com o discurso de que ama todos os filhos de maneira igual, não sei se por afinidade ou outra coisa, todos os filhos sabem quem é a "queridinha do papai".


Por não viver com meu pai neste momento, uma das coisas que mais sinto falta é quando ele sai dançando desengonçadamente uma música qualquer_ou mesmo sem música_ pela casa afora.


Gozador de marca maior, parece que foi ontem que eu estava na primeira série e ele me disse que no fim das orações, o ponto final é onde os passageiros são obrigados a descer do ônibus. E interrogação é quando os passageiros perguntam "por quê". Ou quando na quinta série fui dizer ao meu pai o que era passo tesoura e ele passou o dia inteiro fazendo um "pivô" estilizado.


Meu pai nunca foi um exemplo de masculinidade pra mim _não que ele seja afeminado, longe disso_ por não ser o modelo de pai que leva o filho pra jogar bola, soltar pipa, andar de carrinho de rolimã ou fazer programas ou ter conversas de pai e filho.


Hoje é dia dos pais e por eu estar na faculdade hoje, sem poder estar perto dele, antes de telefonar pra ele, resolvi deixar aqui uma_ das muitas impressões que tenho_ do homem responsável pela minha existência.


A bem da verdade, acho meio desgasante conversar com meu pai, pois não falamos definitivamente a mesma língua. Acredito que ele sinta o mesmo.Mas sei que a nosso modo nos amamos, ainda que nos comuniquemos em línguas diferentes.